domingo, 23 de janeiro de 2011

Orfã em um cemitério de livros esquecidos



Ontem fiquei orfã. Não é a primeira vez. Já perdi as contas das vezes em me senti desprotegida, furtada desse amor paternal. Ontem fiquei orfã de um livro.

Quando leio, busco algo mais do que um mero passatempo. Busco proteção naquele cheirinho gostoso de novo que, para mim, assemelha-se a um abraço de mãe. Ao ler me torno personagem. Já fui noiva do Drácula, me perdi em um país das maravilhas, soltei pipas no oriente, caminhei na Alemanha em pleno Holocausto e fui uma menina que roubava livros. Investiguei assassinatos em cidades americanas, visitei o Louvre, fui guerrilheira em Cuba. Na terra média me senti em casa e em barcelona, fui assassinada. No fim de cada jornada, os perdi e me perdi.

O sentimento é de perda e os danos irreparáveis. Já refiz alguns dos mesmos caminhos, mas nada se compara ao primeiro toque nas páginas imaculadas, ao primeiro contato com pessoas que, por dias, viram família. Família do tipo acolhedora que nunca reclama, mas abre os braços e produz palavras de conforto sempre que é preciso.

Machado de Assis, Oscar Wilde, Neil Gaiman, Stieg Larsson, Nelson Rodrigues, J.R.R. Tolkien, Truman Capote... pais que amei. Marion Zimmer Bradley, Clarice Lispector, J.K.Rowling, Raquel de Queiroz... mães que me acolheram.

Eles, entre tantos outros, se foram. Voltaram em outros enredos, mas no fim sempre me deixam. Desolada, inúmeras vezes em pranto, marco alguns momentos do meu caminho com gotas de lágrimas que se espremem entre palavras e afagos.

Estou orfã. Dessa vez de Zafón. Chorei com Miguel Moliner, me identifiquei com Daniel Sempere e Nuria Monfort, aprendi a amar Fermín Romero de Torres mesmo que fosse em uma Sombra do Vento.

Estou de luto que logo cessará, pois já tenho um encontro marcado com Larsson onde espero me sentir uma menina que brinca com fogo. Mesmo assim a Alemanha de Zusak ou mesmo a floresta de Sherwood, de Barie, nunca serão deixados de lado. Eles estarão em uma prateleria reservda para mim no cemitério dos livros esquecidos que me foi apresentado por Zafón.

Aprendi com um deles que alguém só morre quando é esquecido. Eu estou orfã, mas de pais imortais.

W.A.M.

Um comentário:

Marcia Lopes Lopes disse...

Gostei muito daqui! Queria que soubesse e copiei uma frase sua em minha pág no face Mundo Literário, quando puder na uma passadinha e se gostar curte! Abraço!