sábado, 16 de novembro de 2013

Uma loira gelada, por favor


Sentado em frente ao balcão ele levanta mais um copo. A cerveja desce gelada dando alguns breves momentos de alegria. É preciso de mais.
Em um ponto da festa, a alguns metros, uma moça bebe a mesma cerveja. Os cabelos dourados brilham encantadoramente sob as luzes e o sorriso se abre quando os olhos se encontram. Ela toma coragem e pisca. Ele se vira.
Há meses levantaria para perguntar o nome dela e o esqueceria horas depois de uma noite juntos. Agora não. Do nada começou a sentir algo que nunca o havia acometido. Um vazio profundo. Um buraco se abriu em sua alma e o coração dói a cada dia. E antes nem achava ter coração. 
Cansou de buscar, "se divertir com as erradas enquanto não chega a certa", como sempre diz. Mas como saber se a certa já não chegou e ele a deixou passar em meio a incontáveis mulheres. Vazias, fúteis, desnecessárias. Mulheres que nem mesmo lembra os nomes.
Em anos conseguiu sexo fácil, beijos selvagens, mensagens quentes, mas anseia por dar um beijo apaixonado, fazer amor, falar com os olhos e testar a cumplicidade e parceria de uma vida a dois. Será a idade chegando? Como saber...
A moça de cabelos dourados continua a flertar sem êxito. Sem explicação ele lembra de outra bem diferente. Cabelos negros e longos, olhos escuros e grandes, e um sorriso... um sorriso que nunca soube aproveitar de fato entre uma balada e outra. Seria ela a mulher da vida que deixara passar ou ainda estará por vir? 
Pede a saideira, toma como se fosse a melhor de toda sua vida e vai até a moça de cabelos dourados. Acovardado, pergunta o nome dela... aria... adri... alguma coisa. Não vai fazer diferença mesmo. Não enquanto o medo o impedir de ser realmente feliz.

W.A.M.

Contadores de histórias


Na rua, entre uma entrevista e outra, uma senhora me pára. Ela tem os cabelos presos despretensiosamente e rosto de maternal. Carrega consigo uma chinela de borracha, uma foto de uma moça e o peso do mundo. Com olhos marejados e voz chorosa ela faz um apelo:
_ Minha filha sumiu e eu estou desesperada! Por favor, me dá um espaço para tentar encontrá-la!
Pausa. Olho para a foto de uma moça feliz com uma criança no colo e um rapaz notavelmente apaixonado ao lado. Engulo em seco enquanto minha garganta dá um nó. Como explicar que na correria entre uma pauta e outra não posso parar por 2 minutos para ouvir o apelo de uma mãe sofrida, desgraçada pela dor e angustia de não saber onde está a filha? Explico. Dou as costas e então me curvo, como se o peso do mundo recaísse agora sobre mim.
No carro, em direção à próxima pauta, minha mente não para de martelar. O que é um repórter a não ser um contador de histórias? Uma pessoa comum com o dever de falar sobre outras. Somos escritores do cotidiano. Se os buracos na rua incomodam a comunidade, vamos ouvi-la e dar uma resposta. Se seu Francisco vê seu gado morrer por falta de água, cabe a nós ouvir seu desabafo. Se a dona Maria está desesperada em busca da filha perdida, porque não ouvir sua dor, seu lamento, sua história.
O sofrimento, a alegria, as mãos rachadas, os olhos marejados, o banco da praça... detalhes para uma história que só vive através de um personagem.
Eu, como protagonista da minha, me sinto orgulhosa por poder contar histórias, por ter a oportunidade de conhecer Franciscos, ,Marias, Joões e Josés.
Quando uma história não pode ser contada bate a dor, como uma orfã de um livro recém-lido que só se recupera após o próximo.

W.A.M.